sábado, 10 de dezembro de 2011

Passado preso em uma tira do seu vestido que enroscou no arame.

_________________

Mulher,
Passa o seu batom vermelho,
que vou te levar pra dançar.
Escova bem esse teu cabelo,
pra ficar bonito de olhar.

Roda bem
Roda o mundo inteiro
Roda o chico, roda o dinheiro.
Sol acorda vasimbora,
boca seca, mulher, vamimbora.

Moça, depois disso digo,
que eu sou homem direito
e não que faz efeito
eu aqui cabreiro
tentando por acordar.

Olho pro meu lado direito
você ainda a sonhar.
Foi tiro certeiro,
esqueço o tiroteio,
visto calça, calção, camisa, cinzeiro,
fico sem ar e vou trabalhar.

Levando por levar,
levanto por levantar.
Respiro que sou vivo,
Corro porque caminho,

Volto pro lado esquerdo
porque não canso de sonhar.

Sai dessa cama,
sai desse quarto.
Troca a fronha
Desfaz o dia.

Abre a janela,
ranca as cortinas.
Já estou farto
dessa vida mesquinha.

Meu nariz não abre
de ranço pelo cheiro podre.
De toda a lama e ranho
que escondemos dentro do cofre de chave perdida.

Abriu com safanão,
saiu vampiro, esqueleto e múmia,
gritando blasfêmias e injúrias
cuspindo sangue e palavra
que ecoou pra sempre
no meu nariz.

Olha pro espelho
e vê.

Agora fecha essa boca
que seus dentes estão podres.
Fecha os olhos
que essa imagem não é sua.
Vê seus cabelos,
sua boca, sua cútis.

Olha pro espelho
e vê.

Meus dentes bruxistas,
Meus olhos ensacados
Meu espectro de lua.
Vê meus cabelos ao vento,
minha boca sua, minha pele nua.

Você não é ninguém sem mim.
Eu não sou nada sem você.
E antes que a gente esqueça:


domingo, 4 de dezembro de 2011

Definitivo - Carlos Drummond de Andrade

______________________

"
Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram. Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos,por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade. Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar. Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender. Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada. Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar. Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável,um tempo feliz. Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso: Se iludindo menos e vivendo mais!!! A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento,perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional..."

Opcional e Definitivo

_______________________

Bom, acho que posso ir contando como vão minhas corridas, não sei se isso vai ser um estímulo ou vai te deixar chateada por estar parada. Mas, como eu disse, fiquei 1 mês sem conseguir andar, e 2 meses sem treinar, foram semanas difíceis, não menos pela dor que sentia, mas principalmente por não conseguir esvaziar a cabeça. Por muito tempo, morando sozinho, aprendi a não depender dos outros, e conseguir satisfazer semanas e meses sem sair com ninguém, e sem ter um contato intenso com alguma pessoa. Apesar de isso me fazer muito bem, a mente fica sobrecarregada, repleta de fumaça, pois para evitar a mente vazia, tudo ao meu redor se torna um pouco de filosofia. "Há filosofia em barbear-se todo dia." Para evitar as ideias vazias, e os pensamentos irrelevantes, todo o pequeno ato do meu dia se torna uma reflexão, e invariavelmente ao fim de certo tempo, minha cabeça vira um baú repleto de memórias fumacentas que eu troco por nuvens toda a vez que saio para correr. Durante um tempo tive que aprender que não se pode ser feliz sozinho, a felicidade é dividir, compartilhar, e fiquei de certo modo triste por perder essa individualidade que agora estou retomando. Sempre que me sentia assim, saia para correr, como se 1 ou 2 horas comigo mesmo fosse suficiente para organizar as coisas. E tem sido assim. Quando me lesionei estava namorando uma garota há 8 meses, e sem o apoio dela e de sua familia, não teria me recuperado, pois meus pais não puderam estar presentes nessa fase. Isso gerou uma certa dependência deles, -que hoje não são mais presentes em minha vida- já que todo o final de semana passavam em casa e me levavam para o hospital tomar injeções anti inflamatórias e analgésicas. Hoje eu não posso depender de ninguém, e sair para correr, é muito confortável para sedimentar essas memórias, ao invés de alimentar saudades.
Ainda sinto dores quando corro, mas todo corredor tem seu mantra, e levo dois comigo por toda corrida:
"-Não há dor pior do que não terminar uma prova." Lance Armstrong
Não completar uma prova, não atingir uma meta são dores que ficam martelando em todos os treinos, e competições seguintes depois que você descobre que qualquer dor física é passageira;

"-A dor é inevitável. O sofrimento é opcional." Carlos Drummond de Andrade
Já parece clichê, mas é uma verdadeira lição para a vida, bem como o resto do poema:
"Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram."

Frustrações com planos e metas estão no nosso caminho inevitavelmente, e temos que aprender a lidar com essas dores. O tempo que estive parado, aproveitei para fortalecer músculos que nunca tinha trabalhado tão intensamente, e adquiri uma resistência em toda a extensão da coluna e nos braços que me ajudam muito nas subidas que agora enfrento. O organismo desenvolve resistência e seus músculos se acostumam aos estímulos desde que tenham frequência regular, são como cavalos de carga, o aumento de carga é um estímulo diário, uma quebra nessa frequência é suficiente para colocar tudo a perder. Busque fortalecer outras partes do corpo e sua própria mente afim de quando você estiver recuperada, seu organismo esteja acostumado em superar desafios.
Tudo isso parecem dicas de um velho, ou de alguém que tem algo a dizer. Muito provavelmente minhas conclusões sejam equivocadas, e talvez só se aplicaram a mim pois correr e me exercitar é algo que me veste bem; assim como outras pessoas se sentem bem jogando tênis, vôlei, basquete, eu me dou bem correndo. Minha musculatura foi esculpida para isso talvez. Só sei que voltar a correr depois de muito tempo não foi um desafio ou uma etapa difícil, mas pelo contrário, foi agradável e prazeroso. Ontem a noite corri 10km perto da meia noite, enquanto as pessoas iam curtir seus sábados em baladas aqui perto. Moro em uma região com muitas baladas, a duas quadras da Rua Augusta, point quase todos os dias daqueles que vão se divertir, e muito provável sou motivo de chacota quando visto minhas calças leggin e saio desafiando a garoa gelada, mas o iPod está alto e não escuto.
A trilha sonora é um elixir nessas fases de recuperação. Gosto de escutar bandas com ritmos marcantes, principalmente com algum estímulo digital. Ontem, montei uma playlist com Beck, Gorillaz, Two doors Cinema Club, Bombay Bicycle Club, e Fela Kuti, um jazzista africano. Foi o bastante para dinamitar meu tempo 4 minutos mais rápido. Hoje cedo fui repetir a dose, desci a Rua da Consolação até o Elevado Costa e Silva, que aos domingos fica fechado para fluxos de carro e se torna uma espécie de High Line nova iorquino, sem árvores. É fantástico se deparar com esse espaço projeto para máquinas repleto de pessoas utilizando-o de maneiras distintas. Me misturei aos que corriam, tomavam sol, passeavam com cachorros e namoradas, faziam churrasco ou tiravam fotos. Foi dolorido, pois o Sol não perdoava, e a ausência de árvores era amenizada somente com os ventos fortes canalizados pelos prédios do entorno. Fora isso, é apaixonante estar no centro da cidade de São Paulo, e ver seu horizonte oscilar entre Edifício Copan, e seu sósia na altura da praça Quatorze-bis; edifício Italia e o Banespa como que gigantes adormecidos.
Como dizer que arquitetura não é a carreira certo para um apaixonado pela cidade? É uma profissão que lida com paixão, amor e devoção. E é muito disso que vivo, inclusive, em minhas corridas por São Paulo.

Bom Domingo!

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Amor próprio

__________________________

Me pergunto por que corro. E não sei dizer se há um motivo para correr, por simples correr. Não é um esporte competitivo, não tenho planos de seguir carreira; não torço pra nenhum corredor, nem acompanho mundiais e torneios de atletismo, não sou fanático pelo esporte, mas sou dependente da corrida. Os fanáticos que respondem essa pergunta são sempre enfaticamente repetitivos; correm para emagrecer, metas de superação, correm sem explicação. Não tenho como discordar de todas as respostas, mesmo não sendo algum fanático.
Muitos não sabem que corro, não é meu cartão de visitas. André Romitelli, usa armações grossas, all-star e franja bagunçada. É quase como uma fantasia que visto para encarar uma ausência de realidade enquanto corredor. Para a cidade, não faz sentido tirar uma ou duas horas, três ou quatro vezes por semana para comer bananas, tomar água, calçar o tênis, short, regata e correr. Mas é necessário. A cabeça cheia de fumaça do dia a dia. A cabeça cheia de nuvem enquanto corro.
Fica clara a dependência quando pensamos no sentido fisiológico das coisas. É ótimo sentir a camisa colada ao torço depois de correr 10 quilômetros em um treino simples, sentir um arrepio que percorre a espinha e entorpece a cabeça, endorfina. É muito chato pensar que toda essa sensação prazerosa é dada por um hormônio. Isso tudo é amor próprio, e todo mundo tem um pouco disso. No fim, todos fazemos alguma coisa que nos torna seres melhores, agrada nosso organismo, nossa mente, e não precisa correr 10km. O fumante que fuma 1 cigarro a menos no dia, pensa como está se cuidando; o sedentário que troca o elevador pelas escadas -geralmente quando acaba a energia- está ciente que fez bem ao si mesmo; o baladeiro que foi dormir cedo, a patricinha que gastou menos no shopping, o vagabundo que levantou antes do almoço, o sujo que toma banho, o limpo que se suja, o arrumado que se bagunça, e o bagunçado que arruma, dormir em uma cama com o lençol esticado é fantástico, mas é bom também dormir em uma cama já quentinha; se atrasar 15 minutos pra faculdade é perdoável, ficar um pouco mais na cama - sozinho ou acompanhado-. Amar-se é conceder prazeres pontuais. Amor próprio se aprende sozinho.

Se você chegou até aqui me conte sobre alguma permissão que lhe fez bem. Juro que vou tentar também.